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domingo, 7 de março de 2010

Quadrinhos: 100 Balas

O que você faria se alguém te oferecesse uma chance de se vingar de quem te colocou na pior sem ser preso ou mesmo incriminado?


É o que costuma fazer o homem conhecido apenas como agente Graves na série em quadrinhos 100 Balas (100 Bullets) do selo VERTIGO da editora DCComics americana.
Inteligentemente escrita por Brian Azzarello e belamente desenhada por Eduardo Risso é uma das séries adultas mais elogiadas dos últimos tempos. Ganhadora de quatro prêmios Eisner (o Oscar dos quadrinhos americanos), a série se destaca pelo clima noir, pelo mergulho no mundo do crime e suas intenções, e por ter cada arco de histórias centradas em diferentes personagens, tipos comuns, porém interessantes.


O misterioso agente Graves procura pessoas que tiveram suas vidas mudadas pra pior e lhes oferece uma maleta com documentos e provas irrefutáveis de quem os colocou ali, junto com uma arma automática e 100 balas não-rastreáveis. Ele ainda promete a elas que, pelo tempo que tiverem a maleta e as balas, estarão acima da lei. Tentador, não? 


É claro que a isenção de culpa legal não compreende a isenção de culpa moral e esse é o grande atrativo inicial da série. Afinal, se temos pessoas que iriam com certeza até o fim da vingança, outras nem cogitaram tal idéia, até que a maleta é apresentada, claro.


Um das grandes razões para se acompanhar lealmente a série é a grande conspiração que se revela ao conhecermos mais sobre o agente Graves e seu passado. Peças de um aparentemente gigantesco quebra-cabeça são apresentadas em pequenas doses, a cada comovente conto de vingança que conduz as tramas principais.


O texto de Azzarello é recheado de dilemas morais construídos inteiramente sobre pessoas como eu ou você, a maioria que cometeu erros que gostaria de não ter cometido. Trejeitos, sotaques e situações bem reais evocam a verossimilhança de cada personagem. Identificação imediata com o leitor, afinal, quem não gostaria de mudar uma ou duas coisas importantes na sua vida? 


Outro ponto de destaque é brilhante construção dos roteiros da série, que geralmente têm mais de um nível de atenção, por exemplo, nas páginas que envolvem apenas diálogos entre personagens os desenhos quase sempre mostram ações de segundo e terceiro plano que são importantes para o entendimento da trama principal, ou mesmo de tramas futuras. 


Azzarello é craque em criar mini-tramas escondidas em várias edições cujos personagens vão se repetindo, como, por exemplo, a do pequeno Moe e do detetive Choisnel, que não passaram de quase-figurantes nas tramas principais, até agora. No fundo, está tudo ligado, como diz um personagem-chave numas das primeiras edições.


É claro que os vários planos não te impedem de apreciar sem compromisso a trama principal, porém, na maioria das vezes, é preciso dar mais de uma lida nas histórias, não só pra captar as mini-tramas escondidas no roteiro, mas também para apreciar a belíssima arte de Eduardo Risso.


Seus contrastes entre luz e sombras, seus ângulos de visão inusitados e seu traço num estilo realista e simples são um grande exemplo de como uma ótima história pode ter uma arte a sua altura. 


Tanto que um dos prêmios dados a série foi exclusivamente para ele.


A série teve uma publicação conturbada no Brasil. Suas primeiras edições foram pela editora Opera Graphica que, apesar de ter conseguido alcançar a edição 36 americana, cobrava um preço alto para padrões brasileiros, com apenas uma história por edição e tiragem muito baixa.


A segunda tentativa de publicação foi pela mesma editora, que investiu em álbuns compreendendo várias edições americanas num formato de luxo, com capa-dura e papel especial. Chegou ao sexto volume (edição 42 americana) e faliu.
A terceira tentativa foi pela PixelMedia, que até chegou a elevar os ânimos do público consumidor, pois aplicava preços, formatos e tiragens condizentes com o mercado. Pena que a Ediouro, dona da Pixel, acabou com o setor de quadrinhos adultos da editora.


Mas é que então a Panini aparece redentoramente colocando nas bancas a continuação direta das histórias começadas pela Pixel.

Laços de Sangue compreende as edições 15 a 19 na numeração americana. 
E apesar de conter o número 3 (número de sua encadernação americana) na capa, compreende na verdade ao sétimo arco de histórias em 100 balas.


É a história de Louis “Loop” Hughes, jovem negro que culpa o pai ausente pelas infelicidades em sua vida. O agente Graves lhe dá a atual localização do pai, além da maleta com a arma e as balas. Loop conhece o pai, mas não se vinga, faz as pazes e começa a aprender com ele o ofício de cobrador da Máfia. Mas é claro que nem tudo vai ficar as mil maravilhas.


No meio da trama é revelado que Curtis Hughes, o pai de Loop, trabalhou com o agente Graves, junto aos Minuteman, grupo de sete pessoas altamente treinadas que agia segundo as ordens do misterioso Cartel, uma organização que, segundo edições anteriores, age há muito tempo por baixo dos panos interferindo na História do Mundo.


Uma história sobre paternidade, sangrenta e, ao mesmo tempo, emocionante, que ensina que nem sempre dá pra voltar atrás nas suas escolhas.


Recomendado!


A quem interessar, nos parágrafos seguintes tentarei fazer um apanhado de tudo que foi publicado nas edições da PixelMedia, que compreenderam os números 1 a 14 da edição americana.


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O primeiro arco de histórias chama-se Atire primeiro, Pergunte Depois que apresenta Dizzy Cordova, uma jovem hispano-americana de 23 anos que acaba de sair da prisão em liberdade condicional. Graves a aborda e oferece a maleta com a foto dos homens que mataram sua família. Dois policiais da cidade de Chicago. 


Entre reencontros, confrontos e descobertas ela vai confirmando cada vez mais essa verdade e ficando com vontade de usar as balas. 


Paralelamente a isso, ela tem um encontro com um homem que se apresenta como Sr. Shepherd, parceiro do Agente Graves, e que termina por recrutar a garota para seus fins.


Na história seguinte, Tiro pela culatra, conhecemos Lee Dolan, que teve sua vida devassada após fotos de pedofilia serem descobertas pelo FBI no seu computador. Sua mulher pediu o divórcio, seus filhos o rejeitam, seu restaurante foi fechado e ele foi a falência. Graves lhe dá a maleta e explica que quem colocou as fotos no computador dele foi Megan Dietrich, atual presidente de uma poderosa companhia de seguros. 
Dolan tenta recuperar sua vida, mas não tem tanto sucesso.


Ficamos sabendo que Dietrich conheceu Graves no passado e que, até então, o tinha dado como morto. É aqui que começa a ser revelado que as ações do misterioso agente podem não ser tão altruístas e sem-sentido como parecem. 


Também é a primeira aparição, em segundo plano, do sanguinário Lono, de quem só viríamos a descobrir o nome nas edições seguintes.


Na terceira história, Pequenos Vigaristas, Grandes Negócios, conhecemos Chucky Spinks, um expert em lançamento de dados, que vive de pequenos golpes em jogos de esquina. 
Ficou preso durante sete anos por um atropelamento do qual estava bêbado demais para lembrar e agora está com dificuldades para aceitarem que suba suas apostas. Graves lhe revela que foi seu melhor amigo que aprontou para ele e lhe dá a maleta. 


E Chuck fica disposto a apostar tudo para não perder essa grande oportunidade.


A quarta história, Dia, Hora, Minute... Man, finalmente nomeia Lono, que através de uma conversa com o agente Graves, nos revela que eles fizeram parte de um grupo chamado Minuteman e que trabalhavam para a organização conhecida como O Cartel até algo dar muito errado em Atlantic City anos atrás e O Cartel querer acabar com eles.


Na história seguinte, Frio como Sorvete, conhecemos Cole Burns, um sorveteiro que usa seu caminhão para vender cigarros contrabandeados pelo chefão local, até que Graves lhe aborda e diz que sua avó foi morta num incêndio causado pelo homem para o qual trabalha.


Cole não está a fim de usar as balas contra seu chefe, mas vai ser colocado numa situação em que será difícil não fazer nada.


Acontece que Cole e o agente tem um passado em comum, que só vem à tona quando Burns ouve uma palavra-chave e recupera sua memória reprimida, tal qual um filme de espionagem.


O sexto arco, Parlez Kung Vous, traz a volta de Dizzy Cordova, que vai a França bancada pelo Sr. Shepherd para conhecer um homem que recebeu sua maleta, mas escolheu não concluir sua vingança, preferindo investigar sobre a origem de tudo aquilo. 


Esse homem lhe dá uma noção da atuação do Cartel na História e fala sobre o grupo dos Minuteman, do qual ela acaba descobrindo agora fazer parte, inclusive mostrando impressionantes habilidades de luta que nunca aprendeu.


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Crimes urbanos, vinganças pessoais e conspirações num clima de espionagem norteadas por emocionantes histórias de pessoas comuns, tudo misturado na medida certa, é o que esperar de 100 balas. 


Daria uma bela série de TV.


Recomendadíssimo!


Valeu!

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